Mais que um conjunto de diretrizes econômicas, o Neoliberalismo se configura como uma maneira de organizar a cadeia produtiva ou ainda as relações interpessoais constituindo-se, portanto, numa Ideologia. As suas raízes podem ser encontradas no Liberalismo, sistema político econômico que defendia a liberdade individual em diversos campos em detrimento de uma suposta ingêrencia social. A partir disso entende-se que as liberdades individuais estariam acima das liberdades "sociais" demandando que a livre iniciativa humana fosse a mola mestra na construção das relações sociais. Colocado de forma prática, o seu cerne está na idéia de que uma certa "mão invisível" controlaria as relações de produção gerando uma ordem benéfica a sociedade.
Com a série de críticas que surgem a esta visão de mundo e as diversas crises geradas (a de 1929 sendo a mais famosa) o Liberalismo como política de estado entraria em torpor por alguns anos abrindo espaço para a lógica do Welfare State.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial e a reorganização geográfica-política do mundo a idéia do Welfare State (incorporado na figura de John Maynard Keynes em função do New Deal) vai predominar nos países centrais (EUA, Europa) ainda que já passe a sofrer ataques conceituais, como é o caso do livro O Caminho da Servidão"(1944), de Friedrich von Hayek. A hegemonia do conceito de estado forte só viria a ser abalado a partir dos anos 1970 com a Crise do Petróleo.
Antes de tudo uma crise de superprodução cuja ponta de lança foi a reestruturação das forças produtivas da Europa e Japão, teve como resultado um processo de recessão econômica em escala mundial. Seus desdobramentos seriam os de sempre: desemprego, piora nas condições de vida, diminuição do crescimento econômico, etc. Era necessário, portanto, que se apresentassem soluções para o impasse. É aí que o receituário Neoliberal passa a ser aplicado.
Charging Bull, Símbolo de Wall Street |
De forma tardia, o Brasil veria um ensaio da aplicação da cartilha Neoliberal no Governo Collor, no início dos anos 1990, e sua adoção como política de Estado a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso. Diversos elementos no discurso da grande mídia passariam a fazer parte no nosso dia a dia. Ressucitou-se o conceito do Cidadão , oriundo do Iluminismo, em que o indivíduo é um ser cujo papel fundamental é o econômico e não o social. Aparece com força a Sociedade Civil, grupo social que não é político e nem militar, mas ainda sim o principal responsável pela sua realidade. Disto constrói-se a lógica de que o Estado inerentemente lento, corrupto e incapaz de oferecer soluções adequadas. Os problemas sociais passam a ser problemas unicamente de má gerência. A mobilização social dá lugar ao voto como única forma de transformação da realidade. Como bem coloca James Petras no seu artigo sobre Non-Governamental Organization: As ONGs no seu melhor servem a uma parcela mínima da população aliviando de forma imediata alguma das suas necessidade e, no seu comum, desorientando a todos quanto as questões profundas a serem debatidas.
Antes de tudo, o poder social de um indivíduo passa a ser visto como fluido, volátil, sem base econômica. O lifestyle substitui o conceito de classe social, dizendo que cada um tem pleno poder de escolha sobre os mais diversos campos da própria vida. Não há explicação isolada para determinado fenômeno, mas diversos. A educação, por si só, seria capaz de erradicar a pobreza. Ascensão da falácia pós-moderna.
Assim, dos dois últimos parágrafos, conclui-se que só é triste quem quer, só é pobre quem quer.
Dentro da saúde o Estado mínimo neoliberal vai produzir uma reorganização do serviço de tal monta que até as relações entre os profissionais de saúde e a população serão afetadas. As ONG´s (3º setor) passam a ter papel central sendo vendidas como solução "civil" para as falhas do poder público. Assim, reforça-se a ação assistencialista ou a capacitação mínima para um mercado de trabalho incapaz de receber a pequeníssima parcela que receberá tal auxílio, lembrando-se que por mais que se force o discurso, tais organizações são intrinsicamente incapazes de substituir o Estado.
A privatização tomará corpo na forma das OSCIPS (ONGS), OSS, FEDPs, PAS, etc... A consolidação de uma lei de investimento para o SUS será negligenciada ou até mesmo atacada. A precarização da Saúde Pública servirá de mote para o favorecimento da Saúde Suplementar. O conteúdo programático das ações em Saúde do Ministério da Saúde será orientado por diversas Ações e Programas, centradas em necessidades sectarizadas, discutindo pouco o que as fragilidades dos mais diversos grupos teriam em comum atacando assim a essência dos problemas. O biopsicosocial passa a fazer parte das escolas do campo da saúde, ainda que possua sérias limitações epistemológicas ou permita, em grande medida, a culpabilização do doente por sua condição. A Reforma Sanitária e toda a discussão da 8ª Conferência em Saúde se esvaem como palavras escritas na areia.
O resultado das políticas Neoliberais foi sentido com vigor mundo afora. A Crise Imobiliária dos EUA e suas derivações são a mostra mais clara. Nos resta lembrar que o Colapso do Modelo Econômico em nada significa seu Colapso Ideológico.
Muito bom!
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